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Relato completo de um parto humanizado

Sempre quis ser mãe, desde bem menina, sonhava com isso, em carregar um bebê e sempre, sempre me imaginei num parto normal.

Meu primeiro filho foi uma gravidez com “planejamento inconsciente” como brinca meu marido, já morávamos juntos há 01 ano e tínhamos acabado de marcar a data do casamento, comunicado às nossas famílias e decidimos viajar de carro para Porto Alegre para o Fórum Social Mundial.

No retorno dessa viagem, descobri a gravidez. Foi um mistura de medo e felicidade que nos impulsionou; casamos, compramos nosso cantinho e tivemos nosso primeiro filho: Felipe. Na época do parto, eu tinha informação e acreditava que era suficiente. Havia lido algumas coisas e acreditava que a via natural de nascimento era o parto normal. Não fazia idéia dessa indústria de partos no Brasil.

Começamos com uma GO, mas no final nos sentimos inseguros com ela e mudamos por indicação de uma pessoa que conhecemos num PS. Marcamos a consulta e o médico com um discurso lindíssimo, atendimento impecável, mostrou-se adepto ao Parto Normal, Dr. M.G. – consultório pomposo no Pacaembu. Com 39 semanas e 04 dias ele me internou no Santa Joana, e mandou induzir. Fiquei duas horas no “sorinho” sem sentir dor, sem sentir nada além de Braxton Hicks, então ele me mandou ao centro cirúrgico e realizou a cesárea.

Justificou que era pela circular cervical que ele só tinha visto no momento do parto.
Estava tão ansiosa e confiava tanto na palavra dele que achei que ele havia salvado a vida do meu filho...

Olha a explicação: o cordão enrolado não permitia que ele descesse e meu filho estava sofrendo! (Socorrooooooooooo!!!)

E eu comecei a criar toda uma justificativa baseada em cordão enrolado no pescoço para a cesárea que fazia muito sentido para mim e que foi meu discurso por quase 3 anos. Como eu não tinha consciência de tudo isso, do absurdo que ele havia feito, das intervenções com meu filho, do absurdo do afastamento precoce, de terem dado nan a ele, enfim, tudo isso estava fora do meu campo de visão. Minha lembrança do parto e da chegada dele tem alegria, felicidade por ter me tornado mãe.

“Um sonho de dois
Virou um de sonhos
Dois: Pérola e William
Um: filho querido Felipe
Nove meses de espera
Sem saber o que nos esperava
Um rosto lindo, uma vida plena
O chorinho gostoso, o olhar encantador
Mamãe chorona com tanto amor, papai cantador com tanto amor!
Quanta vida nos aguarda quantas surpresas, mudanças, alegrias...”
(Poeminha para o Fê - 2005)


Hoje consigo enxergar que fui roubada, que meu filho nasceu antes do seu tempo e que sofreu intervenções desnecessárias e nos desgastamos muito com o hospital, com as rotinas e protocolos deles.

Sofri muito na recuperação da cesárea, com dores, com o corpo dolorido. Foi muito difícil, mas, passou, sempre passa. E a jornada de nos tornamos uma família foi muito mais gostosa, de aprender a ser mãe, de ver meu filho crescer.

Após um tempo coloquei o DIU porque queríamos esperar um tempinho antes de engravidarmos novamente. Assentar tudo. Após um ano e meio de DIU num ultrassom de rotina, a médica me disse que o DIU estava no colo do útero e seria necessário retirá-lo, eu poderia recolocá-lo se quisesse. Optamos por não colocar e na época saquei que meu corpo havia expulsado o DIU. A idéia de uma nova gravidez já estava latente.

Depois de 2 anos e 3 meses do nascimento do Felipe, engravidamos novamente, agora bem planejadinho e com muita expectativa.

Não tinha nenhum GO na época, apenas uma médica com quem fazia consultas de rotina. Peguei meu livrinho da Medial e encontrei um GO próximo a minha casa.

Na primeira consulta ele viu que eu estava com o resultado do Beta HCG na mão, mas soltou a pergunta “qual o problema?” e depois ficou sem graça e disse “problema não boa notícia... rs” – Hoje vejo que era um sinal sutil de como ele encara a gravidez: um problema.

Enfim, esse médico que prefiro chamar de Dr Zen, super tranqüilo, fazia ultrassom toda consulta na própria clínica, não fazia idéia do que era uma doula, e disse que eu podia ter parto normal, mas poderia ter incontinência urinária pós parto, precisaria fazer episiotomia e usaria fórceps. Detalhe: errou meu nome duas vezes e a qualquer sinal de cólica ou coisa parecida me colocava em repouso de pelo menos uma semana.

Ao mesmo tempo comecei a participar da lista maternas_sp e a ler, devorar tudo que falava sobre o assunto (Li Parto Normal ou Cesárea? O Que Toda Mulher Deve Saber (e todo homem também) e Quando o Corpo Consente)

A Ana Cris, maravilhosa, me escreveu alguns e-mails me alertando, me mostrando algumas coisas, assim como muitas maternas.

Ok, depois de todo o papo do Dr. Zen, cansei desse cara e nunca mais voltamos. Após passar toda a listagem de médicos do meu convênio para a AC, vimos que apenas três eram adeptas do Parto Normal. Caramba!

A AC indicou a Catia também e cheguei a marcar e desmarcar duas consultas.
A questão de pagar consulta quando tínhamos convênio era punk.

Vamos lá, então. A médica do convênio já havia atendido uma das maternas e para um GO que atende via convênio, ela é muito boa, atende sem tempo contado, tira as dúvidas, conversa e sempre se mostrou adepta ao Parto Normal, com ressalvas do tipo “O risco de ruptura uterina é pequeno, mas e se for você? Você não vai gostar, né?!”. E sempre deixou bem claro que poderia não acompanhar o parto e nesse caso seria uma de suas colegas de consultório. Isso me deixava insegura. Me deixava insegura também pensar que seria com alguém que eu mal conhecia. A doula ela aceita, desde que seja da equipe dela. Uma obstetriz que cobrava uma nota preta e com isso ela não aceitava doula de fora. A maternidade que ela indicou era a Pro Matre que também não aceitava doulas e toda vez que eu entrava na Pro Matre e era atendida por aquelas obstetrizes não sabia se iam me oferecer um drink ou me examinar...Super maquiadas, parecendo aeromoças (com todo respeito à classe) com quilos de base e cílios postiços...Credo!
A insegurança permanecia constante, ficava ansiosa em ter que negociar o plano de parto e só ter doula em casa, em não saber quem faria o parto.

Nisso já participava mais ativamente da lista e muitas, muitas fichas foram caindo e quanto mais eu lia, mais eu me incoformava com a cesárea que eu havia vivido, com a falta de ética e de caráter de alguns médicos, com o absurdo mercantil dos convênios.

“Você não faz idéia de quantas armadilhas existem no atendimento obstétrico.
Você não faz idéia de como é a formação médica.
Eu não quero que você troque de médica.
Eu quero que você saiba o que está escolhendo e que você abrace o seu desejo.”
(Trecho de um dos e-mails da Ana Cris)


Bom, após muitas noites sem dormir, muitas buscas, muitos e-mails, de uma identificação enorme com a Dra Catia, e de um e-mail certeiro da AC, decidi mobilizar meu marido, médicos, doulas e quem precisasse para ter o parto que eu queria.
Foram noites angustiantes, de conversas com amigas, de trocas de e-mails, de espera.
Sentia que era agora ou nunca! Eu estava com 33 semanas e ainda dava tempo.
Foi um sentimento de que eu tinha que fazer isso ou não seria honesta comigo mesma.
Crescer dói pra caramba, chorei muito, orei muito e entreguei nas mãos de Deus, mas não antes sem fazer a minha parte.

“A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo.”
(Mario Quintana)


Não ia aceitar a fatalidade de uma cesárea desnecesárea, sabendo tudo que eu sabia.
É um caminho sem volta...

Muitos e-mails, muitas conversas e fechamos, a equipe seria Catia, Ana Cris e Dra Nina, substituída no segundo tempo pelo Dr.Douglas...

E o parto seria domiciliar (PD)... Que jornada! De parto normal a parto natural para PD...

Com 38 semanas comecei a sentir cólicas fracas, dores na bacia e pontadas na vagina, e sempre na expectativa de algo acontecer, do meu corpo funcionar como devia, de ser capaz de parir, imaginava o parto, como seria tudo. Muitos e-mails na lista, muitos bate-papos com maternas. Deu tempo de ir num encontro das maternas relacionamentais, de ir ao encontro de fim de ano das maternas com 41 semanas cravadas e até cinematerna rolou...

Caminhadas em parques e muitas saídas gostosas para fugir da ansiedade...

Os pródromos iam e vinham e já tinha me habituado aos sinais falsos e às Braxton Hicks, amigas íntimas...

Com 40 semanas a ansiedade pegou pesado. Muitas meninas maternissímas me escreveram, me pediram paciência e entrega...

“Meia noite e meia
Uma pedra range
Uma porta late
Um cachorro longe
O motor de um carro
No portão de casa
Bate o vento passa
Na janela inteira
Meia lua cheia
Na montanha imóvel
Que me olha imensa
Fora do que penso
No meio da sala
Meu sapato encalha
Nos pés da cadeira
Um som que não pára
No silêncio claro
Do vidro uma abelha
Zumbe em minha telha
Chove minha cara
Velha agora espelha
Na poça uma estrela
Treme e atravessa
O avesso da véspera
Desamanhece
E eu desadormeço”
(Arnaldo Antunes)


No final de semana em que completei 41 semanas, decidi almoçar num rodízio de comida japonesa e me acabei de comer, logo depois fomos para a confraternização de fim de ano das maternas, foi uma delícia. Estava no maior pique, super animada.
No domingo dormi muito, quase a tarde toda. À noite fui à ceia da igreja e ficamos um tempão lá, conversando com todos e comendo bastante. O tema: parto, parto, parto!
Nessa noite, meu filho quis, pela primeira vez na vida, dormir na casa da minha mãe. Algo sem precedentes. Fiquei arrasada, nunca tinha ficado longe dele à noite. Voltei para casa chorando.

Chegamos em casa e assistimos um episódio de “Central de Bebês” da Discovery Home&Health, foi muito legal, mostrou uns três partos naturais e pela primeira vez o Will assistiu comigo.

Fomos dormir, mas antes andei um pouco pela casa e conversei com a minha barriga, com a Bia, dizendo que ela podia vir que eu estava preparada, que iríamos recebê-la com carinho, para ela não temer.

Na madrugada de domingo para segunda feira – 22/12, lá para 4h20 eu imagino, não olhei no relógio, acordei com uma contração bem forte. Não me animei muito porque já tinha acontecido antes. Depois de um tempo, veio outra, olhei no relógio 4h28; como doeu bastante resolvi levantar e nessa hora senti um jatinho de água escorrer e molhar a calcinha e a calça do pijama. Era a bolsa.
Estava começando. Fiquei muito animada.

Decidi acordar o Will e ele ficou todo animado e levantou. Queria ligar para a Ana Cris. Avisei que ainda poderia demorar (mal sabia...rs) e ligaríamos mais tarde, até porque não queria acordá-la tão cedo.

Começamos a anotar as contrações. Vinham de 10 em 10 minutos. Logo estavam vindo de 07 em 07 minutos. Ficamos agradecidos pela sensibilidade do meu filho querido por ter decidido ficar na minha mãe, pois eu e o Will pudemos nos entregar ao momento.
Avisamos um bocado de gente que havia começado.

Conversamos com a AC mais tarde, que pediu que ligássemos quando engrenasse de 05 em 05 minutos por uma hora.

Ouvimos música o tempo todo e eu me sentia muito, muito feliz!

Resolvi descer no prédio para caminhar e quando a contração vinha, no início, eu agachava e melhorava muito. Quando descemos, as contrações espaçaram e ficaram de 09 em 09 minutos e assim foi indo o dia todo. Oscilando muito. Fiquei um pouco desanimada.

Tínhamos marcado uma sessão de acupuntura com a Eneida para induzir naquele dia.
Conversamos novamente com a AC e com a Catia e decidimos fazer a sessão de acupuntura que havíamos marcado para induzir para ver se engrenava o TB. A Catia suspeitava de rompimento alto da bolsa, pois o líquido saía em pequenos jatinhos geralmente após as contrações e algumas vezes molhavam bastante a calcinha.

Após algumas contrações fui ao banheiro e vi que o tampão havia saído.

No caminho de passar na minha mãe para ver o Felipe, de ir para a consulta com a Dra Eneida, as contrações espaçavam e depois voltavam para os tão conhecidos 10 em 10 minutos.

A sessão de acupuntura foi ótima. Relaxei muito, conversamos muito com a Eneida também e o Will, cansadíssimo, até cochilou.

Em seguida fomos para casa da minha irmã, onde havíamos decidido fazer o PD. Mas internamente sentia um desejo enorme de estar na minha casa, com as minhas coisas e isso ficou martelando na minha cabeça. Minha irmã deixou a casa toda arrumadinha, ela foi um doce. Nesse dia caiu uma baita chuva em SP e alagou tudo. Demoraríamos muito para ir para casa. Decidimos tomar um lanche, um McDonald´s (horroroso) e depois voltamos para casa, foi muito boa a sensação de estarmos em casa, com nossas coisas, nosso cantinho. Já havia me acostumado com a dor, mas não conseguia dormir, pois quando a contração vinha e eu estava deitada doía muito mais, eu acabava dando pequenos cochilos nos intervalos que me davam uma sensação de ficar fora do ar muito ruim e me deixava mais cansada.

“Na nossa casa amor-perfeito é mato
E o teto estrelado também tem luar
A nossa casa até parece um ninho
Vem um passarinho pra nos acordar
Na nossa casa passa um rio no meio
E o nosso leito pode ser o mar”
(Arnaldo Antunes)


Sei que durante o dia todo, Will conversou com Deus e o mundo. Muita gente telefonava o dia todo, ajudando com conselhos, dicas e dando muita força. Foi muito legal!

Eu não queria, nem conseguia falar com ninguém.

A Catia aconselhou uma taça de vinho para relaxar e descansar. O Will só encontrou uma keep Cooler e serviu ao propósito.

Depois de uns golinhos, o Will dormiu, eu tomei um banho bem demorado. Eu não conseguia dormir de jeito nenhum. Sentia um calor imenso e a intensidade da dor estava aumentando. Fiquei num processo racional absurdo de anotar os intervalos das contrações e começava a me irritar por não engrenar. Agachar já não funcionava, então eu comecei a rebolar e mexer o quadril quando vinham apoiada na parede do quarto...

Encontrei a Marcia Golz no MSN e ela me deu ótimas dicas, me acalmou...

A certa altura da madrugada decidi entrar no chuveiro e fiquei lá um tempão.
O cansaço era muito grande. Por volta das 6 da manhã, as contrações ficaram de 6 em 6, de 7 em 7, depois de 5 em 5. Fiquei animada. Mas estava doída, com o sono e com o cansaço apertando. Eu cochilava e falava sozinha, andei pela casa de olhos fechados e me concentrava muito nas contrações. Foram ficando muito fortes e doloridas e exigiam que eu fechasse os olhos e respirasse profundamente várias vezes.

Tentei dormir, mas era insuportável. Até que chegou um momento que decidi agüentar a dor e consegui cochilar umas três vezes entre contrações, mas era muito ruim porque começava a sonhar e ver cenas esquisitas e estranhas.

Daí espaçaram novamente para 09 e 10 min.

Algumas vezes dei uns gritos, mas não sentia vontade de gritar. Preferia me fechar. Tentei ficar de quatro, agachada e tudo que me vinha à cabeça. Lá pela metade da manhã, fui pro chuveiro novamente com um banquinho que o Will improvisou e fiquei lá um tempão. Saí, comi algumas frutas (só comi frutas e iogurte com suco) e me senti renovada, um pouco melhor...

O Will conversou com a Catia e ela disse que viria nos ver após o almoço. Minha irmã trouxe um lanche para nós e ficou um pouco aqui. Sentia muita saudade do Fê, mas sabia que não seria possível tê-lo em casa nesse momento.

Meu filho havia avisado que só voltaria para casa quando a Bia nascesse. Um lindo!
A Catia chegou e conversamos sobre a possibilidade do Plano B. Ela me examinou e constatou bolsa rota com ruptura baixa, disse que chegou a sentir o cabelinho da Bia. O colo estava posterior e eu com 2 cm de dilatação. Fiquei arrasada com isso. A Catia sugeriu irmos para maternidade para uma "condução" de parto com ocitocina para engrenar e que lá eu tomaria o antibiótico preventivo, pois não fiz o exame de strepto B. Eu já estava muito cansada e nisso já iam quase 36 horas de latência e de bolsa rota, sem dormir direito.

Lembro que o toque doeu pra caramba. Nessa hora eu gritei muito.

Ok, plano B. Decidimos com muita tranqüilidade que deveríamos ir para a maternidade e fazer o que fosse preciso para ajudar a Bia a nascer.

Tinha acabado de ler um e-mail da Ana Cris que falava da flexibilidade da alma na hora em precisamos escolher e mudar os rumos das coisas...A decisão, a escolha foram naturais, tranqüilas. Tanto eu como Will estávamos bem, conscientes das decisões e acima de tudo nos sentíamos respeitados e acolhidos pela equipe, o que nos dava uma paz enorme.

Pois bem, tomamos um banho, arrumamos a mala da maternidade e seguimos. Passamos antes na minha mãe para dar um beijinho no Fê e fomos embora. No caminho as contrações já estavam bem doloridas e eu pedia ao Will que parasse o carro quando vinham com muita força.

Chegamos à maternidade e fomos dar entrada pelo PS Sentei na cadeirinha e a atendente: “qual o problema, flor?”, mais condescendente impossível. Aí eu disse “ estou em trabalho de parto”. Ela: “Nossa! Ai, meu Deus!”. Eu e o Will rimos e dissemos para ela ficar calma que estava tudo bem. Cada uma. A gente acalmando a mulher...

Confesso: era muito esquisito estar na maternidade, um ambiente impessoal, cheio de gente estranha, alheias ao que eu estava vivendo, cheias de procedimentos e protocolos. Essa parte foi ruim porque já estava acostumada à idéia da minha casa, do aconchego e tudo mais.

Confesso2: Se não fosse pela confiança na Catia e na AC, acho que eu poderia ter travado de vez na maternidade.

Seguimos para uma espera para que a GO do plantão me internasse. Mas ela estava ocupada fazendo uma cesárea. De se esperar, né?

Esperamos, mas nos deixaram numa espera com tudo quanto é gente doente, infeccionada, mulher querendo puxar papo na hora que a contração vinha...Terrível.

Daí o Will chamou uma das atendentes e pediu para que nos levassem para um lugar mais reservado, pois eu estava com bolsa rota. Ele fez um draminha básico para ficarmos com mais privacidade. A enfermeira nos colocou numa sala de isolamento.

Chega a ser engraçado. Ficamos lá papeando e dando risada. Todos que vinham nos ver, nos tratavam como se eu estivesse doente e a gente fazia questão de dizer que estava tudo bem. Estávamos só esperando a nossa médica chegar.

Bom, a GO do plantão chegou e quis me examinar. Eu ouvi ela falando para enfermeira: “Ela está com bolsa rota há dois dias?” Ela não conseguia acreditar, eu ouvi ela repetir isso duas vezes. E depois me perguntou de novo. Eu a avisei que não era para fazer toque, nem nenhum exame. Ela mediu a barriga e escutou o coração. Perguntou se seria cesárea. Disse que não. Ela “tomara que dê certo. Boa Sorte”.

Enquanto isso, o Will fazia malabarismos para esperarmos a Catia no quarto sem ter que ir para o Pré-Parto, até que conseguiu.

Acho que Deus esteve guiando tudo, porque apareceram pessoas muito abertas às nossas “reivindicações” durante toda a estadia na maternidade. Fora a desorganização deles que deu brechas para fazermos muito do que queríamos.

Nesse meio tempo a Catia já estava no hospital e fomos para o Pré-Parto mesmo. Detalhe: tive que ir de cadeira de rodas. Protestei, disse que estava bem, mas eram normas do hospital. Aí perguntei por quê. A moça: “imagina uma grávida andando por aí”, na hora eu e o Will num coro: “gravidez não é doença, não!”. Coitada da moça ficou super sem graça.

Bom, subimos, cheguei à sala e de cara desliguei a TV que estava na Globo.

Encontramos a Catia, logo mais chegou a Ana Cris. Estava completamente tranqüila com elas.

A Catia conversou comigo sobre o anestesista, que podíamos dar sorte e aparecer alguém que soubesse fazer a analgesia, assim como poderia aparecer alguém bem tosco. Decidimos tentar a sorte, porque não teríamos como arcar com um anestesista da equipe naquele momento. A Catia foi conversar com o anestesista de plantão e ele pareceu muito disponível.

As enfermeiras meio perdidas, mas fizeram o que foi pedido e logo tomei o antibiótico e entrei na condução de parto com ocitocina. Eram quase 20h da noite. Jantei e esperamos. De repente a Catia e a AC mudaram toda sala, fecharam cortinas, colocaram foco de luz, apagaram as luzes brancas e o ambiente ficou nosso, uma delícia. Todas que entravam achavam diferente e sempre vinha alguém ver como eu estava. Uma das enfermeiras que ficou durante a noite, foi ótima e ajudou muito, já conhecia a dupla dinâmica Catia + AC do parto da Karine.

As dores estavam muito intensas e eu já estava muito cansada. Depois de um tempo, não lembro bem quanto, a Catia fez um toque e eu estava com 3cm apenas. O toque doeu muito, muito, muito. Nessa hora eu gritei.

Quando a Catia disse 3cm, meu mundo desabou, me senti uma incompetente. Como só 3 cm depois de tudo isso? Daí caí no choro. A AC perguntou se era o cansaço ou os 3 cm. Disse que eram os 3cm. Ela com todo jogo de cintura do mundo me disse que eram 50% a mais do que eu tinha antes. A Catia explicou que o colo estava posterior e devíamos esperar. Devíamos esperar também para fazer uma analgesia quando eu chegasse aos 5 cm para não parar o trabalho de parto.

A Catia e a AC foram descansar. A enfermeira deixou o Will dormir na maca do lado e eu fiquei acordada olhando o cardiotoco. As dores estavam muito fortes e eu lembro que contava rapidinho. Cheguei a contar até 70, 80 para tentar não me concentrar na dor, tentei deixar a onda vir e passar tentei relaxar o corpo e fui fazendo muitas tentativas. Doía demais.

Fiquei esperando, esperando. Acho que eram duas e pouco da manhã quando caí num choro enorme. Chorei pra caramba. Não sabia o que fazer, queria descansar um pouco.
Acordei o Will e pedi para ele me ajudar a decidir se devia pedir a anestesia ou não. Decidimos que queríamos, mesmo que parasse um pouco o trabalho de parto. Eu precisava muito descansar.

Chamamos as meninas. Dessa vez a AC fez o toque e constatou que o colo estava posterior mesmo e a dilatação não tinha evoluído. Na verdade ela nem conseguiu alcançar o colo. Me explicaram que a cabecinha da Bia estava na direção correta mas o colo estava posterior e seria preciso “arrumar” isso de forma manual, mas que sem anestesia eu não iria agüentar pois seria muito doloroso. Tendo em vista os toques, optei pela anestesia e pela correção manual depois.

Chamamos o anestesista. O Will foi junto. O anestesista demorou pra caramba, precisava achar uma agulha, depois não sei o que lá. O Will diz que ele demorou quase uma hora. As dores estavam fortes demais. A AC e suas mãos de fada apareceram. Ela fez uma massagem na lombar que foi simplesmente maravilhosa. As dores foram se tornando até mais suportáveis. Respirou comigo e me conduziu durante as contrações.

Fiquei pensando que se estivesse em casa e ela fizesse isso, eu conseguiria segurar a onda, pois me relaxou muito. Eu parecia um cachorrinho que recebe carinho e fica de barriguinha para cima...Era a imagem que eu tinha naquele momento. Foi fundamental também o suporte da AC na hora da anestesia quando finalmente o anestesista chegou. De novo, a mão de Deus, pois ele fez uma anestesia maravilhosa e foi muito atencioso, explicando tudo. As dores foram embora, mas eu continuava sentindo todas as contrações.

Finalmente voltei para a sala de pré-parto com gás renovado, com energia nova e o relaxamento veio com tudo. O anestesista ainda veio mais uma vez me ver e perguntou se estava tudo bem. Foi um doce conosco.

A Catia fez o toque e meu colo havia relaxado, entrou no lugar certo sozinho e eu estava com 5 cm de dilatação. Santa anestesia! Santo anestesista!
Nessa hora eu capotei. Dormi que nem uma pedra por três horas inteiras que me pareceram dias. Fiquei revigorada. Quando eram seis horas da manhã eu acordei. Depois de um tempo, o Will acordou e as meninas vieram.

A enfermeira legal disse que o turno dela acabaria as 7h, e que as enfermeiras que viriam não eram tão flexíveis. Entendemos o recado.

Nisso chegou uma moça para o pré – parto. Iria fazer a sua terceira cesárea e com quem? Com a GO do plantão.

A Catia resolveu fazer o toque e para nossa alegria estava com 7cm de dilatação.
Fizemos alguns cálculos e imaginamos que a dilatação total viria lá para 10h da manhã.

Comecei a sentir novas dores e fizemos um repique leve da analgesia ainda com o anestesista legal.

Depois de um tempo, quase 7 e pouco da manhã, quase 8, não lembro bem, as dores começaram a mudar. Deixaram de ser no baixo ventre e passaram para o bumbum, com muita intensidade, parecia que eu ia fazer cocô e falei isso para Catia. Logo depois a AC sugeriu que eu fosse ao banheiro e depois caminhasse um pouco. Falei para a Catia, quando levantei, que estava sentindo vontade de fazer cocô mesmo, que era uma vontade no bumbum e que me dava vontade de empurrar. Ela fez o toque e constatou dilatação total. Falou que eu podia empurrar se quisesse.

Então fomos para a sala do centro obstétrico. As meninas arrumaram tudo e me posicionei de cócoras no banquinho, com o Will sentado atrás e as meninas na frente.
A AC ligou para o Douglas vir que a Bia já nasceria.

A Catia chamou a anestesista de plantão e pediu uma analgesia para relaxar o períneo. A anestesista errou a mão e o que ficou anestesiado foi minha coxa. Daí por diante sentia as contrações de novo. Perguntei se podia tomar outra anestesia e a AC explicou que eu não iria sentir nada, nem a Bia sair e concordei que seria melhor encarar sem anestesia mesmo. Só minha coxa que ficou anestesiada. Super esquisito.
Fiquei um tempão fazendo força. E nessa hora o cansaço veio com força novamente. Sentia minha lombar cansada e eu já sem muito fôlego. Lembro que em determinado momento saí do ar, fiquei inconsciente por alguns segundos e avisei as meninas. A Catia pediu glicose no soro e me colocaram um tubinho de oxigênio, ambos ajudaram bastante.

Depois de um tempo o Douglas chegou e brincamos que a Bia podia nascer agora.

Depois de quase duas horas empurrando, uma das meninas sugeriu que eu fosse para a maca. Foi um alívio enorme porque descansei as costas e fiquei numa posição super confortável.
Retomei o fôlego e decidi que minha filha ia nascer. Toda vez que eu empurrava e fazia força imaginava ela saindo do meu corpo, visualizava sua cabecinha saindo e depois seu corpinho. Não sei de onde eu busquei forças nesse momento. Tinha vontade de parar tudo só para descansar um pouco.

A Catia e a AC me diziam que eu estava indo bem e que logo a Bia estaria ali. O Will também me dava muita força.

Nessas horas eu não sabia quem estava na sala, só tinha noção de mim e da voz das meninas e do Will. O resto era um grande borrão. A cada força que fazia sentia muita dor e sentia meu corpo tremer a ponto de não conseguir me mexer. Eu queria muito empurrar, esperava as contrações com ansiedade.
Depois de algumas forças, a Catia falou para eu sentir a cabecinha. Senti e sabia que faltava pouco, mas precisava me esforçar muito. Decidi que nas próximas empurradas ela nasceria. Comecei a gritar um grito que vinha lá de dentro, quase gutural.

A Catia me avisou que logo eu sentiria o círculo de fogo e ele veio. Na próxima empurrada a cabecinha saiu e senti queimar e arder. A Catia tirou uma circular de cordão.

Tinha impressão que eu ia rasgar. Embora racionalmente eu soubesse que não ia acontecer isso, lembro de ter gritado que eu ia rasgar e a AC disse que estava tudo bem. Me deixaram fazer mais força e nessa saiu o corpinho que veio direto para o meu peito.

Senti aquela pessoinha que ficou guardada dentro de mim em cima do meu colo, toda meladinha, fazendo barulhinhos. Lembro de ter dito “então era você que estava aqui dentro, você saiu minha filha”...

Fiquei acariciando ela, o Will veio do meu lado chorando. Não existia mais nada para mim naquele momento só ela, ainda disse que faria tudo de novo se tivesse que escolher. Cada contração, cada dor, cada momento de cansaço valia a pena. Lembro que a AC me disse que eu havia conseguido. Sentia uma energia incrível.

O Dr. Douglas foi cuidando dela ainda no meu colo. Senti o cordão pulsando, vi a placenta que guardei e fiquei encantada com a minha pequena olhando para ela, a conhecendo, vendo seus detalhes. A AC ajudou a colocá-la no meu peito e ela mamou um tempão. O Will cortou o cordão umbilical. Levei alguns pontos pois tive laceração de segundo grau.

Depois que a levaram fiquei aguardando para ir para o quarto. A sensação de bem estar que eu tinha era incrível. Senti uma energia enorme, acho que faria até faxina se deixassem...rsrs...Me sentia muito bem.

A Beatriz não sofreu nenhuma intervenção e só ficou no berçário por 1 hora. Depois disso ficou em alojamento conjunto e só saiu para ser pesada por 10 minutos.
Nos despedimos das meninas e antes de ir embora a Ana Cris ainda me trouxe um iogurte...Acho que foi o iogurte mais gostoso da minha vida!

Naquele momento não sabia por onde começar a agradecer àquelas duas mulheres maravilhosas que me guiaram...

Encontrei toda minha família esperando para conhecer a Beatriz. Eu estava me sentindo muito bem. Tomei banho sozinha sem auxílio de enfermeira, cuidei da Bia sem nenhum problema. Demos o primeiro banho nela.

Éramos uma atração à parte na maternidade. O casal natureba que teve parto normal. As enfermeiras iam lá ao quarto toda hora para conversar sobre isso.
Depois eu descobri que ficaram algumas enfermeiras e pessoas que pediram para assistir ao parto, pois parto normal lá é raridade.

Tivemos alta no dia seguinte com a Bia super bem e eu também.

É difícil encontrar palavras que descrevam os sentimentos que permeiam esse momento da minha vida. Essa insistência, persistência e desejo de trazer ao mundo minha filha de forma digna.

Foi uma jornada nossa, uma jornada que me ensinou que não controlamos tudo, que estamos sujeitos a fazer escolhas a cada passo que damos na vida e que somos responsáveis únicos por essas escolhas.

Meu primeiro filho, Felipe, me ensinou a ser mãe e a Bia me ensinou a ser mãe de novo, mais madura e consciente agora. Mais centrada e mais atenta aos “truques” do mundo.

Agradeço com meu coração, alma e corpo a todos os que me ajudaram nessa jornada!

Eu sou a Pérola, tenho 31 anos. Sou mãe do Fê e da Bia, esposa do Will.
Mãe convicta e apaixonada pela maternidade.
Escrevo no http://mamaeantenada.blogspot.com

Comentários

  1. Linda história! Que vocês sejam muuuuiiiiiiito felizes! Saúde a todos é o meu desejo!

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  2. Que lindo!! Emocionante!! Parabéns, Pérola!!

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  3. Olá! Me chamou a atenção esse post, pois passei pelas duas situações, só que invertido, primeiro um parto humanizado e após uma cesárea sem necessidade... Gostaria de saber os dados das médicas que atenderam a Pérola, pois penso em engravidar novamente e não encontro médicos adeptos ao parto humanizado... Me ajude!!!! Bjs

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  4. Drika, se vc quiser, me escreva no email rosana.oshiro@gmail.com e me informe em qual cidade mora que te indico profissionais que possam te atender ok?

    beijo

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Parir sorrindo

Para quem já viu é sempre bom rever, para quem não viu e acredita que parto é a pior coisa do mundo, ta aqui a prova de que, com bons profissionais e pessoas dispostas a ajudar, o parto pode ser uma experiência de muito prazer! Muito lindo!

Homeopatia e Alopatia: você sabe a diferença?

Por Rosana Oshiro O momento em que a doença afeta nossos filhos é o de maior preocupação para nós que somos pais e mães. Logo queremos levá-los ao médico para que receite algum medicamento que os livre "daquele mal". Já falamos aqui e aqui sobre a febre, e o hoje vou falar de duas principais formas de tratamento de doenças infantis: Homeopatia e Alopatia. Você sabe a diferença entre elas? Quando ouvi falar sobre homeopatia pela primeira vez, imaginei ser algo como "remédio de curandeiro" ou uma "simpatia" e nem dei muita bola...huahuahuahuahuauha Conversando, certa vez, como amiga que cursava faculdade de "Farmácia" ela me explicou de forma simples e clara que: - Homeopatia é o tratamento feito com substâncias "iguais" às da doença, buscando combater a doença como um todo. - Alopatia é o tratamento feito com substâncias "opostas" às da doença, que busca combater os sintomas das doenças. Depois, pesquisando mais e lendo sobr

Licença maternidade no Japão

É comum as mulheres trabalhadoras não conhecerem seus direitos e deveres quando gravidas no Japão. Recentemente, recebi várias instruções no curso de japonês que realizei pela JICE e gostaria de passar para as que estão em duvidas de seus direitos. Vou escrever por tópicos de forma bem clara e simples, caso alguém tenha alguma duvida, pode me escrever pela guia de contato ou deixar seu comentário no post que terei prazer em esclarecer. Vamos lá! - Como já disse em uma postagem anterior, toda mulher gravida no Japão, que não tem o hoken (Shakai ou kokumin) deve providenciá-lo o mais rapido possível, porque só através dele é possível receber os benefícios que a lei concede. - A mulher que trabalha, há mais de 1 ano com o mesmo empregador (se for empreiteira pode ter mudado de empresa), e tem o Shakai Hoken há mais de 1 ano também, tem direito a licença maternidade remunerada em 60% de seu salário normal, durante o período da licença. - O periodo de licença é de aproximadamente 98 dias,